Maria Alice da Silva Ramos Sena

            O Projeto “Toque... e se toque!” iniciou-se em 11 de novembro de 2006 em dois núcleos diferentes: duas escolas na III CRE[1] no município do Rio de Janeiro e quatro escolas no Município de Mesquita Idealizado pela profa. Maria Alice da Silva Ramos Sena como um projeto de extensão para moradores de comunidades populares, o “Toque... e se toque!” teve como parceiros o Colégio de Aplicação da UFRJ, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Prefeitura de Mesquita, e a Prefeitura do Rio de Janeiro.  Participou de licitação para a realização de projetos do Programa Escola Aberta e recebeu o patrocínio da FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos

Tem como objetivo contribuir para a melhoria da qualidade da educação, a inclusão social e a construção de uma cultura de paz toque5pela utilização de metodologia em Educação Musical que permita reforçar a identidade cultural e artística da população envolvida, por meio de vivências da prática musical de conjunto, numa abordagem focalizada no repertório da Música Popular Brasileira, assim estimulando a sua participação na vida cultural da cidade.
Considerando que a identidade é construída no cotejamento pelos indivíduos entre sua subjetividade e a objetividade contextual[2], pretendemos, aqui, discutir metodologias que sejam sensíveis a essa dinâmica. Como conceber, pedagogicamente, metodologias de educação em Música voltadas para as subjetividades e os contextos dos jovens oriundos das camadas populares de nossa cidade? Quais são os seus anseios e necessidades?
Adequar metodologias de ensino da Música à realidade do público-alvo aprendiz é a questão da nossa pesquisa. Refletir sobre os princípios que norteiam esse processo de ensino e aprendizagem é um dos nossos objetivos.

Pensamos que deva ser uma metodologia participativa[3], coerente com uma visão de educação culturalmente contextualizada, baseada nas músicas do cotidiano dessas populações, possibilitando simultaneamente ao morador das comunidades populares a sua expressão e a ampliação de seu campo de percepção.  Por isso, optamos por desenvolver metodologias que tenham como suporte a Música Popular Brasileira.

Concerto Jornada Pedagogica 12c 8 agosto 2012  Mini Concerto 22 Felipe 22c 11 agosto 2012  P1160013

Para o usuário das comunidades socialmente desfavorecidas esta metodologia põe em relevância o aprendizado das técnicas necessárias para o uso de instrumentos musicais, também pertencentes ao seu universo cultural – violão, cavaquinho, percussão, flauta-doce, incluindo sua própria voz e o treinamento auditivo, coerente com um ensino de música baseado no trinômio ouvir-interpretar-criar. Tal treinamento permite aos usuários a prática da escuta, contribuindo para o exercício da atenção, abstração, domínio do simbólico e posterior apropriação das formas simbólicas da humanidade.[4]

            Com oficinas para o aprendizado desses instrumentos, por meio da vivência em grupo para crianças, jovens e adultos, utilizamos um repertório musical voltado para os interesses e potencialidades da comunidade e que valorize a produção dos artistas e da cultura nacionais. Além disso, pesquisamos técnicas de didática em Música que possibilitem o acesso de todos os que querem aprender, sem priorizar o talento ou qualquer outro fator discriminatório.

As atividades ocorrem aos sábados e são aplicadas por estudantes do curso de Graduação em Licenciatura em Música da UFRJ; tanto atende aos alunos por meio da aquisição das habilidades artísticas mencionadas como também serve de laboratório para os licenciandos propiciando, assim, a vivência dos entendimentos musicais dos cotidianos e a elaboração da sua práxis em sala de aula, viabilizando a sua inserção no mercado de trabalho.

Ao atribuir aos grupos a escolha do repertório, o projeto demanda que o licenciando esteja atento ao contexto em que se está trabalhando. Quando se utiliza um repertório totalmente distante da realidade dos indivíduos, este não poderá funcionar como mote para um trabalho de ampliação das possibilidades técnicas, perceptivas, interpretativas e criativas das pessoas. E aí nos deparamos com a segunda questão de nossa pesquisa: que métodos utilizam a Música Popular Brasileira como suporte para as questões técnicas a serem desenvolvidas? E, mesmo que encontrássemos métodos com essas características, como suprir a demanda pelas novas músicas que estão sendo vinculadas na mídia e que se tornam parte do repertório de nossos alunos? Como acompanhar essa demanda com um método fechado?

Tornar os graduandos em Música aptos a construir seus próprios arranjos, a elaborar seu material pedagógico e, principalmente, a vivenciar uma educação participativa, na qual alunos e professores constroem, juntos, o seu conhecimento, é a terceira questão que nos impõe. Como tirar o licenciando, futuro professor de Música de nosso País, da posição de “depositário” de informações para parceiro na construção do conhecimento musical de nossos alunos?

Procurando responder a essas questões organizamos nosso trabalho. Entendemos que a metodologia utilizada no Projeto “Toque... e se toque!” confere significado ao processo de ensino e aprendizagem, posto que apresente significação para os indivíduos, contribuindo para o fortalecimento de sua auto-estima. Tendo a Música Popular Brasileira como suporte incentiva a participação da comunidade e contempla a sua diversidade cultural e dos seus membros. Estes adquirem visibilidade porque seus potencial e auto-estima estão manifestados por meio da arte e em coletividade, da maneira mais voluntária e prazerosa. Sem dúvida, a prática musical em conjunto é uma estratégia artística cujo reflexo nos jovens participantes se dá por um sentimento sincero de inclusão social e de reconhecimento dos seus valores mais humanos e particulares.


Recital 28729   

SENA, Maria Alice da Silva Ramos.
Mestre em Música e Educação pela Universidade do Rio de Janeiro; professora de Música do Colégio de Aplicação da UFRJ,  maestrina e arranjadora vocal,  idealizadora e coordenadora dos Projetos Toque... e se toque!” e “Canto, logo existo!”
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. 10a.  Ed. Rio de Janeiro; Bertrand Brasil, 2007.

DANIELS, Harry. O indivíduo e a organização. In: DANIELS, Harry (Org). Vygotsky em foco: pressupostos e desdobramentos. Tradução por Mônica Saddy Martins e Jafot Cestan. 2. Ed. São Paulo: Papirus,  1995. .

DOLL William E. Jr. Currículo, uma perspectiva pós-moderna. Tradução por Maria Adriana Veríssimo Veronese. Porto Alegre:  Artes Médicas, 1997.

HABERMAS, Jürgen. A lógica da ciências sociais. Petrópolis, RJ: Ed. Vozes, 2009.

MOLL, Luis C., GREENBERG, James B. A criação de zonas de possibilidades: combinando contextos sociais para a instrução. In: MOLL, Luis C. (Org.). Vygotsky e a educação: implicações pedagógicas da psicologia sócio-histórica; trad: Fani  A.Tesseler.  Porto Alegre: Ed. Artes Médicas,  1996.

THIOLLENT, Michel. Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo Cortez, 1996. 

REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação.4. ed.  Petrópolis: Vozes,  1997.

SLOBODA, John. A. Music as a language. In WILSON Frank, ROERMANN  Franz L.(eds), Music and child development. St Louis: MO.MMB Music Inc, 1997

VYGOTSKY, Lev Semyonovitch. A formação social da mente. 6. Ed. São Paulo:  Martins   Fontes,  2000.

VYGOTSKY, Lev Semyonovitch. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1998.



[1] III CRE corresponde à III Coodenadoria Regional de Educação, localizada nos bairros de Higienópolis e Lins de Vasconcelos, no Rio de Janeiro

[2] HABERMAS, 2009.

[3] THIOLLENT, 1996

[4] BOURDIEU, 2007.